sábado, fevereiro 07, 2009

O financiamento dos partidos

A neutralidade e o desinteresse absolutos são ilusões. Não existem. Contudo, são ideais-tipo (à Max Weber) inalienáveis. Daí que se constituam como valores fundamentais em diversos sectores ou situações da sociedade: o jornalista deve relatar os factos tal como eles lhe aparecem, o professor é obrigado a avaliar o aluno como se o desconhecesse, o cientista tem que se preocupar meramente com a verdade e não com tendências pessoais, o juiz é obrigado a julgar os casos cego a interesses, os políticos devem governar sem atender a pressões particulares mas unicamente ao bem-comum.
Se a neutralidade e o desinteresse não são valores adquiridos e fixamente incorporados para todo o sempre nos indivíduos que actuam, são, não obstante, valores alcançáveis pelo esforço continuamente renovado em cada circunstância que se coloca. E mesmo assim, nunca em absoluto. Por isso, além de ser necessário que os indivíduos possuam cultura cívica e espírito ético, porque uma parte de cada um de nós ainda é um lobo do homem, a sociedade cria mecanismos estruturais e legais que não só punem as infracções como procuram evitar as tentações ou as oportunidades.
Isto nem sempre acontece. No caso particular, e altamente consequente a vários níveis, dos políticos, existe um mecanismo, aparentemente óbvio, que pode tornar mais prováveis a neutralidade e o desinteresse: a limitação do financiamento dos partidos à fonte estatal. Portanto, os partidos serem somente financiados por dinheiros públicos. O que parecerá para a demagogia um atentado aos fundos de todos nós é, como tal, um mal menor. Senão vejamos: se é legal que um partido receba financiamentos particulares, como é que podemos esperar que um político não compense, activa ou passivamente, o dador? Ninguém dá sem receber, nem ninguém recebe sem se sentir obrigado a dar. A existência estrutural e legal deste tipo de fonte financeira afasta ainda mais o político do ideal-tipo que lhe dá legitimidade ética e está presente no seu corpo ideológico.
Provavelmente, teriam que se aumentar as quantias envolvidas, pois todos sabemos quanto custa uma campanha. Todavia, não teriam que ter os níveis de hoje. Aliás, a diminuição do aparato propagandístico poderia ter como consequência uma maior valorização da argumentação em lugar do espectáculo. Assim, ainda que o sectarismo e o interesse não desaparecessem, as probabilidades que apontam para eles decerto seriam menores, o que poderia favorecer práticas mais abertas e dirigidas a problemas comuns.

Sem comentários: