quinta-feira, janeiro 19, 2006

Comunidade – a inevitabilidade e o esforço

Pensar a noção de comunidade parece impor-se quando, a um tempo, as comunidades se cruzam aparentando diluição e exigem consensos entre si num processo de manutenção da substituição da violência pela palavra (apanágio discreto da democracia) na procura de subsistência. Para tal reflexão, socorro-me da metáfora do comboio. Por um lado, porque anda. Por outro, porque pára. Quando acedo a este meio de transporte, introduzo-me em algo que já se movia antes de “parar” para mim, que, nesse sentido, me precede com o mesmo carácter com que me passa a acompanhar. Assim, a comunidade onde nasço já existia antes do meu parto, inculcando todo o seu movimento anterior na minha posterioridade. Esta é a dimensão móvel da metáfora. A imóvel revela outro aspecto da comunidade. Embora um indivíduo queira parar apenas numa estação, vê-se obrigado a parar noutras para obedecer à vontade dos demais passageiros, que, por sua vez, se constrangem à opção da pessoa em causa. Uma comunidade é também isso, um conjunto de vontades niveladas pela sujeição à distribuição das oportunidades dadas. Portanto, para já, uma comunidade é uma inevitabilidade (movimento que nos antecede) e um esforço (espera que se constrói).

2 comentários:

Alexandra Baptista disse...
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Alexandra Baptista disse...

Curioso, a democracia parece ser uma espécie de ditadura... porque nos leva, por outra via, à normalização e nos reduz, em última instancia, o número de variáveis ou o «género» das necessidades nessa procura ou imposição consensual.
A verdade é que o primeiro comboio foi completamente ultrapassado pelo TGV no entanto, um não deixa de ser consequência do outro. Ainda existem comboios que param em cidades e outros em todos os apeadeiros e existem vários horários e circuitos que tentam dar resposta às necessidades «genéricas» da comunidade.
Sendo a comunidade «um conjunto de vontades niveladas pela sujeição à distribuição das oportunidades dadas» convinha que nos centrássemos na questão do nivelamento, porque isso (julgo eu) é uma questão ideológica. Actualmente, fala-se demasiado no esvaziamento desse plano ideológico. O que modela então a comunidade se as ideologias morreram?
Sendo a comunidade uma «entidade» viva e dinâmica, como poderei saber se ela está previamente determinada... ou se «é», por exigência própria, reflexo da sua mutabilidade? Bem sei que um certo movimento nos antecede mas, para além disso outros factores e fenómenos modeladores se alteram propondo novos modos de ver e agir.