quarta-feira, junho 06, 2007

A ausência e o impulso

É costume apontar-se a inteligência como a grande causa da civilização e duma hipotética superioridade do ser humano em relação aos outros seres vivos. Contudo, ela parece mais um vidro seco que arrepanha, uma chama de pedra que limpa o escuro do sovaco ou uma aranha branca cuja teia apenas sabe captar regularidades no caos aparente. Metáforas à parte, a inteligência é uma chata, no sentido literal: achatada – porque, só, alarga-se sem subir. O que efectivamente avança, julgo, levando-a com ele, é o impulso imediato à ausência que, tanto biológica como culturalmente, constitui o humano que, assim, é angustiado na paragem, ainda que luminosamente inteligente. A inteligência serve, pois. Mas sem uma espécie de vontade (à Schopenhauer), talvez a inteligência fosse cega (como os conceitos sem os sentidos, para Kant) e inútil. Talvez um Deus imóvel que tudo visse aborrecido na sua monótona felicidade.

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