segunda-feira, junho 06, 2005

Um dia normal

A normalidade vai fossilizando a expectativa, e o que se espera reduz o imprevisto a uma insignificância tão quantitativamente diminuta quão larga é a previsibilidade da rede que nos dirige um futuro como um mapa dos dias. O normal dá-nos uma certa segurança e a impressão de uma infinita repetição reconfortante, é firme como o veludo de um sofá e o programa sempre a horas da TV em frente, colorida, eterna, sem percalços – os acidentes estão programados em função da credível sensação de vida. E nisto, podemos sempre aproveitar a ranhura, a pequena autenticidade que irrompe como um fio de luz de dia numa sala escura, que nos diz, aterradoramente, que a vida é um abismo. E aí o espanto faz-nos morrer afogados na entrega à superfície ou abre-nos o coração e tudo é magistral.

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