quinta-feira, junho 02, 2005

Clubismo II

Como resposta ao comentário de Filipe Mesquita ao post Clubismo, posso dizer que concordo em parte com o que ele diz. Concordo com o diagnóstico feito à nossa sociedade de consumo, denunciando a dificuldade cada vez maior em construir um sentido que emane das suas práticas e defendendo que isso se reflecte no fenómeno futebolístico. Subscrevo que, em clubes como o F.C. do Porto, os particularismos históricos das regiões onde se integram, marcadas por resistências, alimentam a pertença a um clube através de um sentido transferido de fenómenos exteriores ao futebol em si - este foi o aspecto principal que não tive em consideração no post referido. Reconheço ainda que os clubes têm histórias diferentes, o que constrói identidades diversas. Todavia, entrando em discordância e excluindo os ditos clubes marcadamente regionalistas (que, numa sociedade globalizada, têm tendência a esbater o seu sentido especificamente regional e extra-futebolístico), julgo que o que distingue a maioria dos grandes clubes do mundo é uma história cujo sentido não é escolhido pelo adepto que a eles adere, o sócio ou simpatizante, antes da capacidade de escolha se formar, como que já está dentro do jogo pseudo-desportivo de campos virtuais em combate facilmente constatável se se presenciar uma conversa de café e que tem, reconheça-se, uma função dialógico-social muito mais interessante que os ditos sobre meteorologia. Assim, fazer parte de um destes clubes não é optar por um valor de projecto ou de ética, e convém repetir, pertencer aos clubes regionalistas é-o por transferência e não porque esses valores emanem dos clubes em si. Isto também se aplica à vivência da vitória. É mais fácil um adepto do F. C. Porto sentir que ganha a Lisboa e ao centralismo económico-político da capital (sentido extra-futebolístico difícil de verificar) do que um do Benfica sentir que vence a mais alguma coisa que não seja ao F. C. Porto e ao Sporting - aqueles contra quem nutriu a disputa nos jogos sociais discursivos em pura distinção cega. Aí, ganhar pelo que emana do clube é encontrar o vazio, embora o sentimento de superioridade relativamente aos opositores aparentemente o desminta. Portanto, sintetizando, um sentido extra-futebolístico é transferido para o clube no caso de este se distinguir regionalmente, mas quando o não é penso que esse sentido está ausente e a disputa vive da simples diferenciação instintiva e puramente competitiva. Julgo ainda que este último caso predomina.

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