Ser de esquerda ou de direita, por vezes, parece tão vazio e tendencioso como ser de um clube de futebol. Ser de direita implica, sempre, defender a administração Bush, a penalização do aborto, as privatizações, uma certa aproximação à igreja e uma sociedade de mercado liberalizado. Ser de esquerda, por sua vez, acarreta optar por posições contrárias: atacar a administração Bush, a penalização do aborto, as privatizações, as aproximações à igreja e o mercado aberto a todas as concorrências. Mas pergunta-se: um indivíduo que discorde por completo das medidas da administração Bush, seja a favor da penalização do aborto, católico e contra o mercado livre, poderá integrar-se por completo, sem dificuldades de comunicação, num dos opostos da barricada política? Não será a necessidade de cada indivíduo ter os dois pés num dos lados e, para o fixar ainda mais, de obedecer ao partido onde se sente representado efectivamente um dos grandes factores de ineficácia da política para resolver problemas que, longe de metafísicas utópicas, são, antes de mais, pragmáticos?
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2 comentários:
Honestamente, julgo que tens alguma razão. Mas a direita de que falas não é toda a direita. Como bem sabes, também há uma direita militante e tão cega como a esquerda radical. De qualquer modo, o teu ponto de vista parece-me pertinente. Um dos grandes desafios da esquerda de hoje é encontrar, paradoxalmente, um lugar heterogéneo, pois deve a si própria a obrigação de proteger a diferença, logo também o saber sê-la e aceitá-la dentro de si.
Abraço
Poder-se-ia então dizer que a esquerda é mais monolítica até num sentido remetaforisado de uma cena que gostamos sempre de evocar do cinema: o começo do "2001 Odisseia no Espaço".
É mais monolítica porque foca-se constantemente no monólito da origem, mas depois do monólito onde estão os instrumentos para mudar as coisas? não há nenhum macaco na esquerda que tenha encontrado o instrumento para fazer "descer" o monólito. E porquê? Será que o monólito da esquerda não tem a possibilidade de tornar-se instrumento. Será que o monólito da direita é ele mesmo um instrumento?
Abraço.
P.S. É muitas vezes menos vazio ser-se de um clube de futebol que ter uma inclinação política marcada. Porque no futebol a razão que está na origem de ser-se de um clube é tão dispersa e nebulosa quanto as razões que estão no seu fim, a saber: ganhar, gritar, poder ser tendencioso, reverenciar, amargurar-se, saltar, exultar, embebedar-se, ter conversa sempre à mão, agradar ao marido, etc
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