quinta-feira, outubro 27, 2005

Da amizade

Se nada é incondicional, também a amizade o não é. Por isso é naquilo que a condiciona que desvelamos o seu valor e a vemos ser o que é. Assim como em tudo, a condição determina o condicionado fazendo emergir a figura ou carácter da experiência vivida: sou algo em função de uma situação e de um valor. Assim, por exemplo, considerar que só existe amizade sob a condição da convivência permanente (não a inicial, mas a contínua, extensa e não necessariamente profunda), é fazê-la depender de casualidades espaciais e temporais cujo valor é instrumental: hoje sou teu amigo porque estás aqui e permaneces aqui, amanhã, se estas condições não se verificarem, a amizade deverá esfumar-se. Contudo, fazer corresponder à amizade os condicionamentos valorativos da honestidade, da fidelidade ou da correspondência ética e cognitiva (e, sem dúvida, da convivência, mas em profundidade e não em extensão), parece caber melhor a uma ideia cuja existência é ser das poucas condições para uma efectiva superação do individualismo desprovido de ethos que singra nas sociedades contemporâneas.

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